A Agenda 2030, o desafio da inclusão de pessoas com deficiência

A Agenda 2030, o desafio da inclusão de pessoas com deficiência
Foto: Miguel Mendoza

A igualdade, ou sua plena satisfação, é o grande deficit dos Estados com relação às pessoas com deficiência. As discriminações estruturais e essa visão hegemônica que nos vê como seres assistidos ou inclusive descartáveis aos que há de se proteger afastando-nos da vida em comum, continua impregnando as políticas públicas e a perceção social para nós.

A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência nasce para romper este paradigma e para dizer ao mundo que nossa realidade deve ser entendida, assumida e respeitada como uma questão de direitos humanos.

Este Tratado situa o indivíduo no centro de todas as decisões que lhe afetem e localiza o centro do problema fora da pessoa: na sociedade.

Em lugar de ver-nos como sujeitos passivos de atos de beneficência, nos empodera e nos capacita

Reconhece-se, assim, que as pessoas com deficiência somos sujeitos de direito, com direitos; e que o Estado e outras entidades têm responsabilidades para garantir nossa plena cidadania.

Este paradigma da deficiência baseado nos direitos, não se vê impulsionado pela comiseração, senão pela dignidade e pela liberdade. Busca os meios para respeitar, apoiar e celebrar a diversidade humana mediante a criação de condições que permitam a verdadeira inclusão das pessoas com deficiência.

Em lugar de ver-nos como sujeitos passivos de atos de beneficência, nos empodera e nos capacita para que sejamos protagonistas do nosso destino e ser assim parte ativa da sociedade: na educação, no trabalho, na vida política e cultural e na defesa de nossos direitos, mediante o acesso à justiça.

Uma década depois da adoção desta Convenção foi adotada a Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, um compromisso mundial para que a igualdade seja uma realidade que permeie em toda a humanidade e, sem dúvida, uma oportunidade excepcional para catalisar, a ainda precária situação, dos direitos das pessoas com deficiência.

O Comitê Espanhol de Representantes de Pessoas com Deficiência (CERMI), consciente do valor deste novo Pato mundial quis contribuir a seu desenvolvimento efetivo valorizando uma das questões nucleares da Agenda 2030 como é a implicação e participação das organizações da sociedade civil, como agentes imprescindíveis na luta contra a exclusão, catalisadores dos direitos humanos e elementos de base para garantir a higiene democrática.

As pessoas com deficiência e suas famílias conformamos uma massa social de doze milhões de mulheres e homens na Espanha e nosso sentir se deposita em um movimento social chamado CERMI que se converteu na expressão associativa deste coletivo em nosso país.

O CERMI nasce para mudar desde a raiz, a vezes em seus efeitos mais obscenos, um estado de coisas enquistado perante o qual, por justiça, decência e dignidade, ninguém pode resignar-se a condescender.

Este processo de mudança protagonizamo-lo, a título individual e grupal, as pessoas que vivemos na própria carne esta negação lacerante de normalidade cívica que impede ou dificulta em extremo o acesso a bens sociais ou exercício de direitos humanos fundamentais. Aspiramos ser percebidos e tomados a atuar como membros valiosos e ineludíveis, respetáveis e respeitados da família humana.

Havia de se deixar patente o valor da deficiência organizada no desenvolvimento, bem entendido, dos povos. Somos um movimento associativo exigente, crítico e beligerante perante a desigualdade; mas ao mesmo tempo somos cooperadores necessários e propositivos para que se pratique a igualdade transformadora da mudança sociocultural.

Essa igualdade que questiona a visão hegemônica na que persiste o tratamento diferenciado por motivos de deficiência e que contribuirá a erradicar as formas sistêmicas e mais ocultas de discriminação.

Apelamos e reivindicamos o diálogo civil no marco desta nova aliança pela equidade e a sustentabilidade, pois é o instrumento para uma nova governação aperfeiçoada, onde a toma de decisões é partilhada e se faz corresponsável. Todas as políticas públicas sociais, de igualdade ou de inclusão, devem estar presididas por este princípio.

Os movimentos sociais não podem substituir o Estado, mas sim devem ser garantes e vigilantes da melhora coletiva. Neste sentido, o CERMI está realizando um estudo que descreverá a contribuição das organizações da deficiência a metas ambiciosas que pretendem impulsionar uma mudança para que a população mundial, toda e sem exceções, alcance o status de Humanidade: com direitos e liberdades assegurados.

Aspiramos ser percebidos e tomados a atuar como membros valiosos e ineludíveis, respetáveis e respeitados da família humana.

Queremos ser um ativo desta viagem, porque contamos com experiência e conhecimento demonstrados para que sociedades hostis, reticentes e negativa às pessoas com deficiência sejam hoje mais inclusivas e tolerantes conosco.

E vamos a reivindicar uma Agenda 2030 que se nutra dos princípios, valores e mandatos da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, porque é esse o marco jurídico e normativo no que queremos estar e porque foi construída com as mãos das próprias pessoas com deficiência.

As mulheres e meninas com deficiência terão um espaço protagonista neste Relatório do CERMI porquê, além de representar 60% do coletivo, vivem essa dupla exclusão por serem mulheres e por terem uma deficiência, que aqui não só se soma, senão que se multiplica, distanciando-as de qualquer esfera de inclusão.

Este novo Acordo é uma nova ocasião para trazer à luz e reverter tantas práticas nocivas que as mulheres e meninas com deficiência vivem: entre elas as esterilizações forçadas, a violência machista e seu precário acesso ao emprego.

A Agenda 2030 dever ser, além disso, uma chamada ao ativismo das próprias mulheres e meninas com deficiência.

Mas também estaremos vigilantes para que os acordos desta Agenda sejam vigorosos e, principalmente, que se façam efetivos; não queremos ser objeto de mais expetativas frustradas e ansiamos ver reparado este deficit de cidadania que nos situa em posições periféricas.

O desenvolvimento humano não pode deixar ninguém para trás e a Agenda 2030 junto à Convenção devem saldar uma dívida de desigualdade, pobreza e discriminação para com as pessoas com deficiência.

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