“As Agendas Locais de Gênero permitem escutar as vozes das mulheres”

A V Cúpula Ibero-americana de Gênero 2020 reafirmou a necessidade de incluir a voz das mulheres nos territórios urbanos. Falamos com Ana Falú, diretora acadêmica da reunião.

“As Agendas Locais de Gênero permitem escutar as vozes das mulheres”

“A crise por causa do Coronavírus expôs, em cada cidade do mundo, uma série de desigualdades que têm a ver com a violência de gênero, a divisão sexual do trabalho, a participação política das mulheres nos espaços vitais”, diz Ana Falú, diretora acadêmica da V Cúpula Ibero-americana de Agendas Locais de Gênero, que foi celebrada entre os dias 28 de setembro e 2 de outubro.

Ana Falú é arquiteta, acadêmica e uma das maiores especialistas mundiais em habitat e mulheres.

O evento denominado “Municipalismo e Agendas de Gênero em tempos de pandemia. Repensando o mundo desde a igualdade” foi realizado através da plataforma online Fila Cero e foi liderado pela União Ibero-americana de Municipalistas (UIM), um programa adscrito à Secretaria-Geral Ibero-americana (SEGIB)

Ser uma mulher não garante nada. Tem de existir um compromisso com as agendas de gênero e com a agenda de direitos humanos

“Esta pandemia abre-nos a possibilidade de repensar estes territórios urbanos, suas prioridades, e poder articular as vozes dos que estão nos distintos setores: do Estado, dos partidos políticos, da academia, do setor privado, mas em particular, dos governos locais e das feministas”, reflexiona Falú.

E esclarece: “Ser uma mulher não garante nada. Tem de existir um compromisso com as agendas de gênero e com a agenda de direitos humanos”.

Mais de 1.000 assistentes de 23 nações conectaram-se ao encontro durante quatro dias, tendo como sede de referência a cidade de Colima, no México.

Durante a reunião foi aprovada a Declaração de Colima, um documento que exorta os governos locais a impulsionar as Agendas Locais de Gênero para a Ibero-América.

 
O que as mulheres querem?

 

“Necessitamos cidades mais agradáveis à convivência”

“Queremos espaços mais seguros”

“Queremos trabalhos dignos”

“Somos diferentes, mas não queremos ser desiguais”

 

“As mulheres dizemos estas coisas; não é que as digamos só desde a elaboração teórica e política, que é necessária, senão desde nossos próprios lugares. Estes espaços permitem escutar as vozes das mulheres”, descreve Falú.

Segundo o Observatório de Igualdade de Gênero da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), as mulheres continuam sendo as que mais dedicam seu tempo a trabalhos não remunerados, têm menos participação política e sofrem mais a violência de gênero.

No contexto atual, diz Falú, “as mulheres dos bairros populares são as que apresentam maiores carências, as que estão mantendo os refeitórios, os merendeiros, as que estão cuidando, às vezes sem insumos, da higiene da população, as que se reúnem e discutem sobre onde deve ir sua prioridade”.

 

Políticas integrais

A Declaração de Colima afirma que é necessário colocar nas agendas públicas velhos desafios que a pandemia evidenciou ainda mais, tais como as violências, as tarefas de cuidado, a saúde sexual e reprodutiva, a economia e a brecha digital.

Então, como contribuir a essa autonomia das mulheres a partir de políticas que equiparem essas desigualdades que estão instauradas na sociedade.

“Necessitamos dados comparativos e políticas integrais que tratem as mulheres como cidadãs de primeira categoria, porque elas também necessitam ter ingressos e o reconhecimento de sua capacidade e liderança no campo da participação política”, enfatiza.

Temos de estabelecer qual será a porcentagem do orçamento que vamos pôr nisto, onde temos de priorizar e, em desmedro de quê, vamos fazê-lo

Para a arquiteta, as políticas a favor das mulheres costumam ficar à margem dos orçamentos e, por isso, é necessário planificar desde o território e com a articulação de atores.

As Agendas Locais de Gênero devem ser “uma guia para reverter estas situações com uma política integral que aplique uma porcentagem do orçamento e que incorpore instrumentos de equiparação que gerem consensos entre todos os atores”, declara.

“Temos de estabelecer qual será a porcentagem do orçamento que vamos pôr nisto, onde temos de priorizar e, em desmedro de quê, vamos fazê-lo”, explica Falú.

“Por isso, esta Cúpula é importante porque não só reúne mulheres em postos de decisão, senão também autoridades, ativistas, acadêmicas, e por isso seus consensos têm valor”, conclui.

O evento foi resultado do trabalho coletivo da UIM, do Conselho de Ciência e Tecnologia de Colima (CECYTCOL) e do Instituto Eleitoral de Colima, e contou com o apoio da SEGIB e da ONU-Mulheres, entre outros organismos.

 

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