Redes de ciência e tecnologia, contribuição para a crise da saúde

O trabalho do Programa Ibero-americano de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento (CYTED) e o conhecimento acumulado pela ViroRed foram cruciais para dar resposta à pandemia. Entrevistamos suas autoridades

Redes de ciência e tecnologia, contribuição para a crise da saúde

“Se há algo evidente que esta crise deixa é que o desenvolvimento científico e tecnológico, assim como a cooperação internacional, são fundamentais para lutar contra uma pandemia como esta”.

Estas foram as palavras do novo secretário Geral do Programa Ibero-americano de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento (CYTED) Luis Telo Da Gama, professor da Universidade de Lisboa, em uma entrevista com Somos Ibero-América, na qual também participou, desde o Uruguai, o cientista Juan Arbiza, professor de Virologia da Universidade da República.

Telo Da Gama afirma que tinham certeza de que deviam dar uma rápida resposta aos países ibero-americanos. Então, “decidimos continuar com o que vínhamos desenvolvendo em saúde e reiniciar uma das redes exitosas do programa que se chama ViroRed (Rede Temática de Viroses Emergente), onde Juan Arbiza foi parte da equipe coordenadora”.

 

A trajetória da ViroRed

O apoio da ViroRed-CYTED à Ibero-América se remonta a 2004, “perante a necessidade dos países de estudar o hantavírus, o arenavírus e o dengue, entre outros”, relata Arbiza.

A ViroRed terminou em 2008 e em 2009 apareceu a influenza H1N1. Então o CYTED convocou os virologistas para que restabelecessem a rede.

“Foram quase 15 anos de cooperação ibero-americana que articulou 21 países colaborando em saúde e enfermidades virais. Poder realizar protocolos de diagnóstico conjunto, adequá-los à Ibero-América, e intercambiar reativos e controles foi muito importante”, detalha Arbiza.

Foram quase 15 anos de cooperação ibero-americana que articulou 21 países colaborando em saúde e enfermidades virais

E agrega: “Essa foi a fortaleza. Fizemo-lo de maneira articulada com outros atores, comunicando nossos resultados”.

 

Novas áreas de cooperação e o futuro

Tradicionalmente, a ViroRed tinha mais atuação nas áreas de diagnóstico e laboratório. Mas com a COVID-19 incluiu o componente clínico, o tratamento e a prevenção, “essencialmente desde um ponto de vista prático do intercâmbio de experiências”, especifica Telo Da Gama.

Os entrevistados contam que pediram a cada um dos países que nomeassem dois especialistas dos centros de referência para cada um destes componentes.

“Isto está começando. Faz dias fizemos ensaios com alguns laboratórios. Existe a necessidade, por parte dos países, de poder intercambiar protocolos ou resultados dos kits serológicos”, explica Arbiza.

Os dois coincidem em que o resultado do intercâmbio será muito importante para a Ibero-América, já que cada país tem uma realidade diferente. “Isso vai levar a lançar recomendações para resolver a crise e servir de base para futuras emergências”, destaca o virologista.

 

Em busca de financiamento

O titular do CYTED diz que, devido à emergência pelo Coronavírus, teve de se avançar rapidamente com fundos próprios do programa, mas que esperam encontrar formas de financiamento distintas para o próximo ano.

“Temos uma oportunidade única de tirar partido das experiências dos 21 países, de transparência e confiança mútua, e o intercâmbio de conhecimento, entre os cientistas, os políticos, pondo as coisas claras para os cidadãos”, afirma Telo Da Gama.

Temos uma oportunidade única de tirar partido das experiências dos 21 países, entre os cientistas, os políticos, pondo as coisas claras para os cidadãos

Isto é um ponto importante, aponta Arbiza: “Foi demonstrado que os cientistas importam, mas se não há dinheiro não é possível fazer nada”.

“Os cientistas vínhamos advertindo sobre vírus fazia anos: o chikungunya, o zika, o dengue. Estávamos preparados para isso. No entanto, este vírus (COVID-19) nos agarrou mais desprevenidos”.

Há de se investir em ciência para que tudo seja melhor. Tomara que isto sirva de experiência”

“Às vezes há um distanciamento entre o setor acadêmico, os países e as políticas internacionais no desenvolvimento de vacinas”, continua Arbiza. “Estas redes permitem a articulação necessária para chegar a uma conclusão tomando a opinião de, ao menos, um representante de cada um dos 21 países da Ibero-América”.

“Isso é muito importante e tem um peso enorme na tomada de decisões”, completa.

Por sua parte, Telo Da Gama destaca que, faz muitos anos, o CYTED tem um papel preponderante em articular a ciência e a tecnologia na Ibero-América e que é hora de intensificar esta cooperação em um momento de emergência sanitária.