Ibero-América e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

Somos futuro


Iniciativas de toda a região que estão fazendo avançar os ODS

Foto de Fin de la Pobreza

ODS 1

"O divórcio entre política econômica e política social não funciona perante a pobreza"

Rogelio Gómez, coordenador de Ação cidadã Frente à Pobreza (México)

No México, sem ser um país pobre, a maioria da população vive em situação de pobreza, vulnerabilidade, baixos ingressos e carências sociais. Esta coalizão da sociedade civil em todo o país surge para conseguir melhores resultados frente à pobreza e à desigualdade, incidindo na toma de decisões. Nascemos em 2015 como uma rede de organizações que, havia décadas, trabalhava de forma direta com distintos coletivos. Fazemos campanhas baseadas em relatórios e pedimos medidas concretas, sempre trabalhando com organizações nacionais, locais e internacionais.

O quê funciona na luta contra a pobreza e o quê não?

SÉ necessária uma estratégia de Estado para que as autoridades e a sociedade possam colaborar. Para estabelecer objetivos e que as políticas se baseiem em evidências. Tudo com enfoque de direitos, como marcam a Constituição e os tratados internacionais. Disto há pouco no México. Frente à pobreza, fala-se muito e se faz pouco.

Há de se fazer duas grandes transformações: articular política econômica e política social, e assumir o enfoque de direitos. É urgente a subida do salário mínimo e priorizar o desenvolvimento infantil precoce. Também melhorar a qualidade de educação secundária. Propomos criar um padrão único de beneficiários que permita assignar subsídios de forma objetiva e transparente. Não funciona o divórcio entre política econômica e social nem uma política de financiamento que exclui os pequenos produtores.

Na Ibero-América houve conquistas frente à pobreza e a fome, mas também retrocessos. Qual é a razão?

No México houve altos e baixos, mas a maioria do país vive em situação de vulnerabilidade. A tragédia de nossa gente é que pode trabalhar muito e ainda assim não ganhar o suficiente para adquirir o mais básico. Segundo dados oficiais, 41% dos trabalhadores não têm um ingresso suficiente para adquirir a cesta alimentar. Não falamos de escassez de recursos. Se vemos o PIB per cápita, o México é uma economia média, não reflete a gravidade da situação. Mas, devido a fatores estruturais, há muita riqueza concentrada: 1% recebe o mesmo que 60% da população mais pobre.

Conseguiremos reduzir a extrema pobreza na Ibero-América?

Deveríamos conseguir. A extrema pobreza, o não ter nem para comer, não deveria ser uma realidade na região. É requerida uma vontade política para romper inércias. A situação evoluiu positivamente no Uruguai, no Brasil, no Chile, inclusive no Peru. No México estamos em um círculo vicioso de discricionariedade, clientelismo político, ignorar a evidência e negar a voz aos pobres. No entanto, há boas possibilidades de avanço nos próximos anos. Percebemos um ânimo de mudança, e nisso trabalhamos.

ODS 2

Conhecimento livre para impulsionar os produtores locais

Ainda que a Argentina seja um produtor de alimentos a nível mundial, 90% de suas sementes são importadas de países como a Holanda. A proposta de Sementes Poderosas é desenvolver “um sistema de peletização ecológica para aumentar enormemente a germinação e viabilidade das sementes dos produtores locais”. A equipe acompanha aos participantes na fabricação de uma máquina de peletização de sementes. Este sistema, que os agricultores aprendem a realizar, protege as sementes de insetos e fungos e implementa microbiologia para uma preparação do solo mais eficiente e sustentável.

Para fazer a proposta ainda mais inclusiva, Sementes Poderosas optou pelo conhecimento de código livre. Como alternativa às patentes das sementes híbridas, criam ferramentas e compartilham o que foi aprendido com outras organizações ecologistas e granjeiros, facilitando que surjam experiências similares. Além disso, contam com institutos científicos e universidades para enriquecer a experiência e auditar seus progressos. Em definitiva, trata-se de uma aposta pela agricultura ecológica, adaptada à realidade local e às novas tecnologias.

ODS 3

Receitas para crescer com saúde

Contra a malária

A Bolívia está disposta a seguir os passos de Cuba e do Paraguai e se declarar país livre de malária. Em 2000, registraram-se mais de 30.000 casos desta enfermidade, cifra que se reduziu a 6.800 em 2017. Hoje, 98% dos casos de malária localizam-se na região amazônica. Até aí, o governo boliviano, em aliança com o PNUD e o Fundo Mundial de Luta contra a Aids, a Tuberculose e a Malária, mobilizaram suas equipes sanitárias móveis para garantir que o tratamento chegue a lugares recônditos do país.

A combinação de medidas preventivas, como o diagnóstico precoce e tratamento oportuno, distribuição de mosquiteiros ou a fumigação em áreas onde existem surtos endêmicos produziu um impacto significativo: a Bolívia conseguiu eliminar um dos tipos mais perigosos e potencialmente mortais da enfermidade, a malária por P. falciparum. O programa aposta além disso na educação em saúde e em capacitar às comunidades no gerenciamento dos casos de malária.

A Bolívia, por sua vez, foi parte do projeto global GLOSS, , liderado pela OMS, que busca acelerar a redução de mortes previsíveis causadas por sepse, uma das primeiras causas de mortalidade materna e neonatal. Suas ferramentas chave: a pesquisa, a colaboração, a inovação e a advocacia. Doze países da região ibero-americana, como a Espanha, o Brasil, a Colômbia, a Guatemala ou o Peru, participaram neste projeto.

Foto de Educación de Calidad

ODS 4

As três palavras que estão colocando ponto final ao analfabetismo

Eu sim posso

Cuba, 1959. Na ilha, um de cada quatro cubanos não sabia ler e escrever. Em tão somente dois anos, a pedagoga Leonela Relys, junto a cerca de 270.000 alfabetizadores —cidadãos voluntários e mestres— contribuiu para que a ilha fosse o primeiro país da região declarado livre de analfabetismo na América Latina, como reconheceu a Unesco, um ano mais tarde.

40 anos depois, o programa cubano se externalizou, sob o nome ‘Eu, sim posso’, para erradicar o analfabetismo no mundo. Hoje, quase 10 milhões de pessoas de mais de 30 países, como a Colômbia, a Espanha, a Venezuela, o México, o Brasil ou a Bolívia aprenderam a ler com este programa do governo cubano, que está preparado para se adaptar a diferentes línguas como o quéchua, o aimará ou o suaíli, ou o inglês e o francês.

O método é tão simples como eficaz: o material letivo consta de uma cartilha de cinco páginas, um manual e 17 vídeos. E, pese a sua longa história, continua atualizado e em ativo em diferentes pontos da região, como nos centros penitenciários de Rosário, na Argentina.

ODS 5

Mulheres contra o silêncio

As mulheres da Ibero-América querem reescrever um futuro sem violências nem desigualdades de gênero. Desde o Brasil e a Argentina, um grupo de mulheres criaram Ocupa Beauvoir, uma plataforma web para reduzir a brecha de gênero no mercado editorial e converter as ruas em uma biblioteca de autoras acessível a todos aqueles que tiverem um celular.

Mediante retratos de escritoras, a iniciativa convida a descobrir as obras de mulheres como Márianela Luna ou Maia Morosano. Em cada pôster aparece um código QR que permite que na tela do celular apareçam fragmentos de textos, áudios e outros conteúdos, incluindo o próprio pôster. Com este projeto, o coletivo Ocupa Beauvoir tenta evidenciar a infrarrepresentação das mulheres no mundo das grandes editoras, onde, segundo denunciam, cerca de 70% dos livros publicados estão assinados por homens.

Este projeto convive com propostas a nível institucional que buscam que a América Latina e o Caribe deixe de ser a região mais perigosa do mundo para as mulheres. À reivindicação dos movimentos sociais de ‘Nem uma a menos’ soma-se uma nova iniciativa da ONU e a União Europeia: Spotlight, que já funciona em outras regiões como a Ásia e a África, e que na região aterriza inicialmente em cinco países.

Foto de Agua Limpia y Saneamiento

ODS 6

Comunidades que lideram seu próprio saneamento

A água é um trágico paradoxo na América Latina e no Caribe. Ainda sendo a região com mais oferta hídrica do mundo por habitante, mais de 50 milhões de pessoas não têm acesso à água e cerca de 200 milhões recebem um serviço descontínuo. A situação da Guatemala é uma das mais preocupantes: “Em 98% dos casos a qualidade de água não cumpre com a norma do próprio Estado guatemalteco”, explica o diretor de programa da Helvetas, Jan van Montfort. Esta organização, que está no país há 15 anos, coloca a tônica em empoderar as comunidades para subsanar as deficiências de água e saneamento.

Com a ajuda de aliados como a UNICEF, a Helvetas está implementando a metodologia Saneamento Total Liderado pela Comunidade (SANTOLIC): cada comunidade decide se quer adotá-lo, e são seus líderes os que promovem que sejam geradas mudanças nos hábitos de saneamento e higiene. Motiva-se as comunidades a mudar seus comportamentos para eliminar a defecação ao ar livre, resolver os problemas de saneamento ou melhorar a qualidade da água.

““O bom manejo do saneamento contribui a reduzir em 33% os problemas de desnutrição crônica e das enfermidades derivadas da água de má qualidade —explica Jan van Montfort—. Por isso, apostamos por projetos que fortaleçam a governança e empoderem as comunidades para que sejam elas as que gerenciem os sistemas de água e saneamento e, portanto, protejam seu entorno”.

Graças a esta iniciativa, 6 comunidades erradicaram a defecação ao ar livre e foram realizados importantes avanços em vários dos 93 municípios de cobertura. “Em muitas ocasiões, é a própria comunidade, sem necessidade de esperar pelo Estado, a que constrói, de maneira autônoma, novas infra-estruturas”.

Foto de La tierra, el medio de subsistencia de muchos pueblos indígenas

ODS 7

As energias renováveis hoje são mais baratas que as tradicionais

Ramón Méndez, doutor em Ciências Físicas e ex Diretor Nacional de Energia no Uruguai.

O que pode ser feito para garantir o acesso universal à eletricidade?

A falta de acesso está associada à pobreza. Ainda temos 40 milhões de pessoas sem eletricidade. Mas não se pode abordar este assunto sem atender à mudança climática, a sustentabilidade da matriz energética ou os subsídios às energias fósseis. Querer resolver este problema recorrendo a combustíveis fósseis é impossível desde o ponto de vista ambiental ou econômico.

Podemos fazer a transição energética para as renováveis. É mais rentável. A experiência uruguaia serviu para assessorar uma dezena de países. No Uruguai, entre 95 e 100% de nossa eletricidade vem de fontes renováveis e representou um impacto positivo em nossa economia: foram criados 50.000 postos de trabalho, em um país de 3 milhões de habitantes, e permitiu investimentos de 6.000 milhões de dólares, quando nosso PIB é de só 55.000 milhões.

Como pode ser reduzida a dependência atual dos combustíveis fósseis?

Somos a região do mundo com maior porcentagem de energias renováveis. Mas em temas de mobilidade estamos atrasados. Há de se implementar políticas a longo prazo e consensuadas com todas as forças parlamentárias, e um marco regulatório claro, que dê igualdade de condições para que as renováveis compitam com os energéticos tradicionais. Além disso, devem ser eliminados os subsídios para os fósseis, entre 325.000 e 500.000 milhões de dólares ao ano.

Com as renováveis, o custo do combustível é zero, a manutenção é muito baixa, e o custo é recuperar o investimento inicial. É um negócio financeiro, mas devem ser geradas as condições adequadas para que o investidor perceba o muito baixo risco.

Quais são os principais benefícios de apostar pela transição energética?

Hoje, as energias renováveis na América Latina são mais baratas que as tradicionais. Esta transição representaria a independência de commodities cujo preço não podemos controlar e que só uns poucos países produtores manejam. Significaria, além disso, apropriar-nos de nossos recursos nacionais, agregando-lhe conhecimento e tecnologia, e aumentar a soberania energética da região. É uma forma de avançar rumo ao acesso energético de populações mais afastadas e pobres, e de gerar postos de trabalho, crescimento econômico e melhorar nossas capacidades industriais. Mas, principalmente, estaremos reduzindo fortemente o impacto ambiental e climático.

Se não fazemos a transformação de forma global em pouco tempo, em 2025 teremos alcançado um grau e meio de aquecimento. Tudo o que é proposto nos Acordos de Paris seria lançado pela borda.

Como devem ser afrontados os desafios sociais e ambientais que algumas ramas da energia renovável apresentam?

A ocupação do território está colocando os territórios em maiores apertos, mas por sorte cada vez há mais grupos preocupados por esses impactos negativos. O impacto das energias tem de estar incluído dentro das políticas. O de uma grande hidráulica é indubitável; não tanto o da eólica ou da fotovoltaica. A biomassa é a que tem mais vantagens neste sentido.

Qual é a situação na Espanha, Portugal e Andorra?

Há diferenças importantes. A Espanha e Portugal começaram um caminho muito decidido há um par de décadas. Aprendemos muito de suas experiências, em especial sobre a dificuldade que existiu em garantir a continuidade das políticas públicas a longo prazo, por falta de consenso. Se algo buscam os investidores é claridade. A América Latina está tentando gerar essa confiança baseada em acordos multipartidários. É um caminho inevitável para que os investidores estejam satisfeitos com baixas taxas de retorno.

Como podemos contribuir a nível individual a reduzir o impacto climático e ambiental?

O mais importante é gerar um mudança cultural. Se as pessoas se comprometem, os governos não têm mais remédio que se comprometerem para ganhar eleições. Além disso, temos que entender nossa forma de consumo. Quando compro sapatos, consumo energia. Quando compro um par de óculos, também. A transformação energética passa por repensar o modo de consumo.

Foto de Trabajo Decente y Crecimiento Económico

ODS 8

A terra, o meio de subsistência de muitos povos indígenas

Em Honduras e na Guatemala vivem mais de 7 milhões de indígenas. No entanto, e pese a que seus meios de subsistência dependam em grande medida dos recursos naturais —incluindo bosques e terras aráveis—, muitos deles não têm garantias de que com o tempo siga sendo assim. O reconhecimento dos direitos territoriais dos povos indígenas continua sendo um tema controverso e que impacta em seu bem estar e futuro.

O objetivo deste projeto era reforçar o direito das comunidades indígenas à terra e aos recursos naturais e sua governança, que contou com apoio da FAO e o Banco Mundial. As comunidades conseguiram que o presidente de Honduras reconhecesse, em 2016, a propriedade de mais de um milhão de hectares de terras comunitárias a 17.500 famílias indígenas da região de Mosquitia.

Uma réplica deste projeto, através da Fase II do Projeto de Administração de Terras (PAT II), chegou a outros países da região, como a Nicarágua ou a Guatemala, onde foram registrados mais de 1.444 casos de conflitos relacionados à posse da terra em 2017, segundo fontes oficiais.

Foto de Industria, Innovación e Infraestructura

ODS 9

“A Ibero-América tem de aumentar seus investimentos em infra-estrutura”

Alberto Majó Piñeyrúa, secretário-geral do Programa Ibero-americano de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento (CYTED).

¿O que é o Programa Ibero-americano de Ciência e Tecnologia de Desenvolvimento?

O CYTED é o programa criado pelos governos dos países ibero-americanos para promover a cooperação em temas de ciência, tecnologia e inovação para o desenvolvimento harmônico. É uma grande rede de redes que foi crescendo e mobilizou 23.000 pesquisadores e quase 900 empresas nos últimos 12 anos. Neste momento, tem 5.000 pesquisadores e mais de 180 empresas em redes e projetos vigentes. Isso é um capital intangível importante.

Qual é a situação na Ibero-América com relação a infra-estruturas?

Estamos trabalhando junto com a União Europeia para mapear as grandes infra-estruturas da região, mas, de momento, não há um diagnóstico preciso. No entanto, é inegável que temos infra-estruturas e grupos de pesquisa de excelência e referências a nível mundial em saúde, agricultura, onde temos uma forte tradição, biotecnologia ou energias renováveis. Isso tendo em conta que a América Latina representa 4% de tudo o que se investe em I+D.

Quais desafios encontramos em inovação?

O primeiro é entender que há de se aumentar os investimentos. O grande potencial da América Latina é que tem entornos ecológicos, geográficos e ambientais muito interessantes; se conseguisse ter condições de infra-estruturas, seria um grande ímã de talento. A Ibero-América tem de se propor objetivos ambiciosos para atrair talento e aumentar seus investimentos em infra-estrutura. Mas, salvo o Brasil com 1,2%, não há nenhum país latino-americano que supere 1% de investimentos com relação ao PIB. A Espanha e Portugal se aproximam a 2%, o que ainda fica longe dos países mais desenvolvidos.

A excelência convive com grandes desigualdades na região, como afrontar esta realidade?

Temos uma região tremendamente heterogênea. Em um mesmo país, uma parte da população tem condições do primeiro mundo e outra está fora da economia. Existem, portanto, muitos desafios. Mas a Ibero-América tem a vantagem de ter essa matriz de idioma e cultura comum, e as experiências diversas contribuem a encontrar soluções.

Pode-se unir sustentabilidade e industrialização?

Sem dúvida, mas com maior aplicação de conhecimento. Hoje não se concebe nenhum desenvolvimento industrial que não esteja associado com sistemas energéticos mais eficientes e baseados em energias renováveis. Nesta área houve um avanço exponencial em conhecimento, também em competitividade. Os investimentos em energias renováveis podem concorrer perfeitamente com o petróleo e a indústria fóssil.

Não há uma contradição entre sustentabilidade e desenvolvimento, porque o conhecimento e a economia estão se associando cada vez mais em busca de soluções sustentáveis. Erradicar a pobreza, a inovação, a competitividade... tudo deve convergir rumo à sustentabilidade. Não vejo contradições senão enormes oportunidades de futuro.

Foto de Reducción de las Desigualdades

ODS 10

“Os indígenas, os afros e a população sem terra são as caras da desigualdade na região”

FILAC, América Latina e o Caribe

Mirna Cunningham, presidenta do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e o Caribe (FILAC).

A quem mais afeta a desigualdade?.

As caras visíveis são os povos indígenas, que representam 15% da população total da América Latina, as comunidades afro descendentes e, por último, a população sem terra, forçada por distintos fatores socioeconômicos, e que se concentra, principalmente, nas grandes cidades.

Como se materializa essa desigualdade no dia a dia..

Manifesta-se pela falta de acesso a serviços básicos como saúde, educação, água ou saneamento. Os povos indígenas e as comunidades afro estão atravessados, além disso, por fatores de desigualdade econômica, pela desigualdade estrutural, produto da história de colonização. Hoje, por exemplo, encontramos desigualdades no acesso à segurança jurídica de nossos territórios ancestrais e o controle sobre os recursos naturais. Há uma interseção entre direitos humanos básicos e direitos históricos e coletivos dos povos indígenas e afro.

-Dentro da Agenda 2030, que medidas políticas, sociais, e econômicas deveriam ser adotadas?.

Nós vemos os ODS de maneira integral. Como reduzimos a desigualdade se não reconhecemos a institucionalidade ancestral dos povos indígenas ou suas formas de governança? Como o fazemos se, além disso, não temos acesso à justiça? Uma das primeiras medidas passa por adotar políticas públicas que atendam à transversalização dos ODS. No caso dos povos indígenas, um elemento central deve ser a desagregação étnica por dados, estatísticas e indicadores com pertinência cultural que respondam às realidades de cada um dos setores afetados pela desigualdade. É fundamental para monitorar a implementação dos ODS.

Outro aspeto central é o gênero: as mulheres são a cara mais dolorosa da desigualdade. O gênero deve ser transversal na agenda e deve contar com recursos específicos..

Pensa que os povos indígenas se sentem representados na toma de decisões?.

Nos últimos anos, a região avançou um pouco no reconhecimento jurídico dos direitos dos povos indígenas, mas não tanto como para garantir a participação real. Ainda que tenham se estabelecido mecanismos de participação como mesas de negociação ou de concertação entre povos indígenas e Estado, há uma enorme brecha entre a teoria e a prática. Além disso, nos últimos anos sofremos uma restrição nos espaços de participação, como consequência do modelo econômico vigente e extrativista. Perante isto, tivemos que apelar ao direito de consulta prévia para que os Estados tenham em conta o desejo dos povos indígenas sobre os seus territórios antes de que sejam tomadas as decisões. Houve uma criminalização da protesta indígena.

Foto de Acción por el Clima

ODS 11

Um mapa para construir desde baixo

A melhor ajuda chega às vezes de gente que se encontra muito perto. Civics nasceu para descobrir essas pessoas com grandes ideias e criar uma rede de apoio cidadã. Os participantes usam esta ferramenta digital para deixar no mapa a constância de que se tem um projeto interessante ou, inclusive melhor, que estão disponíveis para ajudar outros a realizar os seus. Este mapeamento voluntário de iniciativas cidadãs pretende criar cidades mais habitáveis, sustentáveis, inclusivas e participativas.

A iniciativa se estendeu pela Ibero-América, convertendo-se em um lugar de encontro para gerar impacto social desde baixo e de forma comunitária. Desde pedir ruas mais limpas à demanda de serviços básicos, qualquer usuário pode deixar constância no mapa daquilo que reivindica, com links a webs e informação valiosa. Vizinhas e vizinhos têm uma via a mais para contribuir ao bem estar social e expressar sua voz para encontrar soluções.

ODS 12

Um atalho rumo a um mundo #SinDesperdicios

Na América Latina e o Caribe, cerca de um terço da comida que cada habitante compra acaba no lixo. Mas a cadeia de desperdícios não cessa aí. Na região, perdem-se, anualmente 127 milhões de toneladas de alimentos, 34% de tudo o que produzido.

A produção e o consumo excessivo contrastam com as cifras da fome: ao menos 42 milhões de pessoas sofrem subalimentação aguda. Com o objetivo de reduzir o desperdício de comida, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) lançou a plataforma #SinDesperdicio. Esta nova ferramenta aglutina a participação de governos, sociedade civil e 6 empresas privadas para otimizar a produção e consumo com o fim de erradicar as práticas irresponsáveis e ineficientes em todas as fases da cadeia alimentar: desde a produção agrícola até o gerenciamento dos produtos nos grandes supermercados.

A plataforma impulsionará quatro eixos de ação: projetos inovadores, geração de conhecimento, hábitos de consumo responsável e a promoção de políticas públicas, como a adoção de padrões de etiquetagem, normativas e incentivos para as doações de alimentos.

Foto de Acción por el Clima

ODS 13

Frear o desmatamento para combater a mudança climática

O desmatamento é um grande aliado da mudança climática. A perda de bosques e selvas é uma das fontes mais importantes de emissões de CO2, o principal gás de efeito estufa que contribui ao aumento das temperaturas. Um sinal de alerta é que o desmatamento na Colômbia aumentou em 23 % entre 2016 e 2017, segundo dados do Instituto de Hidrologia, Meteorologia e Estudos Ambientais (Ideam). Distintas iniciativas buscam reverter a situação, como a Grande Aliança contra o desmatamento.

Através de produtos informativos especiais, este projeto reúne a revista Semana, o Ministério de Ambiente e Desenvolvimento colombiano e o governo da Noruega. Durante sete meses, o objetivo é unir forças para conscientizar sobre as consequências do desmatamento e envolver à cidadania na busca de soluções para um problema que o país se compromete a resolver nos próximos 15 anos. Esta e outras propostas, como o Plano de Ação nacional Bosques, território de vida, e medidas ou como o imposto ao carbono estão em concordância com a promessa que o país andino oficializou na Cúpula de Paris em 2015. A Colômbia assegura que reduzirá 20% a emissão de gases de efeito estufa para 2030.

Foto de Vida Submarina

ODS 14

Práticas sustentáveis que preservam a vida submarina e a pesca artesanal

A adequada proteção da vida submarina perante a ameaças como a poluição, a sobrepesca e outras práticas não sustentáveis é uma das matérias pendentes da América Latina. Com a intenção de abordar estes desafios, o Peru e o Equador apresentaram a Iniciativa de Pesqueiras Costeiras (CFI) - América Latina. Nos próximos 4 anos, ambos os países comprometeram-se a fortalecer a governança a fim de recuperar os recursos pesqueiros, pôr em valor a biodiversidade e gerar empregos mais sustentáveis.

Ambos os países partilham uma grande biodiversidade devido à zona de transição entre dois ecossistemas: a Corrente Humboldt e o Pacífico Tropical Centro-americano. Naquele mar tropical habitam tartarugas marinhas, baleias Jubarte e extensos bosques de manguezais. O projeto pretende trabalhar lado a lado com as comunidades locais de pesca artesanal para que participem no processo de toma de decisões e se convertam em líderes de boas práticas. Em linha com o espírito da Agenda 2030, o projeto busca ter um impacto multissetorial, multinível e multiator. É um esforço conjunto do Ministério do Ambiente do Peru e do Ministério de Aquacultura e Pesca do Equador, com o apoio técnico do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o financiamento do Fundo para o Meio Ambiente Mundial (GEF).

Foto de Vida de Ecosistemas Terrestres

ODS 15

Aliança para proteger a biodiversidade brasileira

O Brasil é um dos países mais mega diversos do mundo, com mais de 163.000 espécies conhecidas. Destas, 3.286 consideram-se ameaçadas, mas há 290 que estão em uma situação mais crítica e para as quais não há iniciativas de conservação. Perante esta preocupante situação, o Ministério de Meio Ambiente assignará 13 milhões de dólares à Estratégia Nacional para a Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção (Projeto GEF-Pró-Espécies) para reforçar a proteção de todas as espécies em perigo do país, priorizando as 290 mais vulneráveis.

Como aponta a WWF Brasil, a agência executora do programa, entre as principais causas de extinção encontram-se a degradação e fragmentação de ambientes naturais, a expansão urbana, a extração ilegal, os incêndios florestais, a formação de lagos para hidroelétricas e a mineração. Frente a estes desafios, a principal estratégia do GEF-Pró-Espécies é apostar pela integração de esforços dos governos federal e estatais, a sociedade civil e as comunidades locais, sob o lema Todos contra a extinção. Com recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente, o projeto atuará em, ao menos, 12 áreas chave em 13 estados, abrangendo um total de 9 milhões de hectares. Planeja-se que esteja em funcionamento até 2022.

ODS 16

Experiências partilhadas para afrontar o crime organizado

O Europa Latino-América Programa de Assistência contra o Crime Transnacional (O PAcCTO) é uma iniciativa comum dos países europeus e latino-americanos que se materializou em 2017. Trata-se de um projeto de assistência técnica entre a União Europeia e América Latina, no qual são intercambiadas experiências entre países membros nos âmbitos policial, de justiça e penitenciário.

Seus objetivos são acompanhar a evolução e especialização dos corpos e forças de segurança dos Estados da América Latina e fomentar a cooperação judicial e fiscal. Também busca apoiar o desenvolvimento de sistemas penitenciários mais modernos, eficientes e respeitosos com os Direitos Humanos. Em linha com o ênfase que o ODS 17 faz sobre a importância de criar alianças, o PACTO promove a cooperação transfronteiriça, regional e internacional para afrontar o crime organizado. As propostas de ação deste organismo focam-se no cibercrime, na corrupção ou no branqueamento de capitais.

ODS 17

O foro para impulsionar soluções em toda a Ibero-América

Abrangendo dois continentes e dois idiomas, a Conferência Ibero-americana é um espaço comum de concertação e de cooperação. Desde a sua criação em 1991, as Cúpulas Ibero-americanas de Chefes de Estado e de Governo intercambiam experiências e conhecimento entre os 22 países que formam a comunidade ibero-americana: aqueles nos quais se fala língua espanhola e portuguesa na América Latina e, ao outro lado do Atlântico, a Espanha, Portugal e Andorra.

Graças a seus distintos foros, nos quais participam, entre outros, organizações da sociedade civil, representantes de empresas e líderes políticos de todos os níveis de gestão, esta grande rede de Estados consegue marcar linhas de ação comuns. A coluna vertebral da Conferência Ibero-americana é a celebração bianual da Cúpula Ibero-americana, uma reunião de alto nível que a Secretaria Pró Têmpore, constituída pelo país anfitrião correspondente, coordena junto à Secretaria-Geral Ibero-americana (SEGIB).

Dessa vontade de cooperação surgem conquistas como o Convênio Multilateral de Segurança Social, Campus Ibero-América ou os Laboratórios Ibero-americanos de Inovação cidadã. Para reforçar laços com a comunidade internacional, conta-se com figuras como os Observadores Associados (Estados) e se desenvolve a Agenda 2030, assumindo os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Tudo isso permite abordar os desafios partilhados e harmonizar os níveis de bem estar na comunidade ibero-americana.

A XXVI Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo de La Antigua Guatemala, Guatemala (15 e 16 de novembro) vai servir para analisar os avanços da região na consecução dos ODS e para reforçar o compromisso de todos os mandatários ibero-americanos com a Agenda 2030.

Com o fim de visibilizar este esforço, a SEGIB lançou a campanha As cores da mudança. A campanha tem como objetivo mostrar o que a cidadania e as instituições da região já estão fazendo para conseguir uma Ibero-América próspera, inclusiva e sustentável; e envia, além disso, a mensagem, de que a Ibero-América pode levar a liderança nesta aposta global pelo futuro.